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PORQUE NÓIS NUM TÁ AQUI PRA SER LEGAL

sábado, 4 de junho de 2016

Heróis e heroínas não são pessoas boazinhas



“porém meu ódio é o melhor de mim.
Com ele me salvo e dou a poucos
uma esperança mínima”

Carlos Drummond Andrade
Menino fugia com carro furtado: Mãe de criança morta pela PM em SP acusa policiais de plantar arma
Estamos com você, Cintia!


Nem réus, nem advogados, nem jornais, e muito menos os  policiais são fontes confiáveis de notícias, mesmo as mais irrelevantes. Há excessões, é óbvio, mas excessões não são regras...O louvável jornalista Caco Barcellos, por exemplo, precisou verificar milhares de ocorrências policiais para, enfim, concluir que a PM mata pessoas negras e pobres em rituais macabros de cumprimento de uma pena de morte tão ilegal quanto aceita por boa parte da população do país.

Como diz o ditado “malufioso”... Bandido bom é bandido...

Deve ser por isso que o Brasil é o campeão mundial em homicídios de jovens entre os  países “sem guerra civil"...

Segundo dados do Núcleo de Estudos da Violência da USP, entre os anos de 1980 e 2002 foram registrados um total de 696.056 óbitos por homicídios no  Brasil. Crianças e adolescentes de 0 a 19 anos correspondem a 16% (110.320) desse total,  sendo que a maior parte das vítimas tinham entre 15 e 19 anos (87,6%, o que se traduz 96.588 óbitos).Nesse período, o assassinato de crianças com até nove anos de idade representou 5% do total.

Isso significa que em 20 anos mais de 5.610 crianças foram assassinadas, em uma época em que as Pastorais da Criança e do Adolescente ainda atuavam fortemente nas favelas de São Paulo – imagina a situação do Norte e Nordeste... - para garantir a sobrevivência de crianças que, como eu, sequer tinha garantida a alimentação diária.

Pois bem, nas últimas semanas, os jornais têm se superado no quesito “show de horrores”. Ganha até d'O exorcista... Eu não consigo ver ou ler... mas escrever é preciso... sendo assim, diante do silêncio perante o assassinato de  crianças, dos inumeráveis e espetacularmente narrados casos de estupros e todas as violações de direitos com as quais convivemos cotidianamente... mais que escrever, barulhar é preciso...

O que fazer então para convencer à população de que a indignação é necessária? Nos convencer de que diante da execução de crianças o país deveria parar, mulheres e homens deveriam sair às ruas e destruir todos os símbolos de poder e consumo que fazem nossas crianças desejarem o que nunca poderão ter e, por fim, ainda as pune duplamente: violenta-nos a infância, negando-nos direitos fundamentais e, mais tarde, quando existe um “mais tarde”, somos novamente violentadas. 

Essa violência vem em forma de criminalização das nossas estratégias de sobrevivência, do superencarceramento, do feminicídio e da cultura do estupro, além das execuções propriamente ditas (fora as outras táticas de extermínio “limpo”).

Será preciso que, como Barcellos, cada uma de nós se empenhe durante anos a fio em uma pesquisa para descobrir o que nós, a população preta e pobre, já sabemos?
Só então é que reagiremos???

Me deixa contar uma coisa: nesta semana estive no SESC Consolação mediando uma mesa com as grandes Mjibas Conceição Evaristo e Jennyfer Nascimento... Eu era a mediadora, mas tinha direito a falar também... Então aproveitei o espaço e a primeira coisa que fiz foi saudar a população carcerária, os presos, suas famílias e associações. 

Me explico: acredito que @s detid@s não têm mais o que perder, então, diferente de nós, ainda mantêm as características que nos tornaram seres humanos, como  indignar-se, organizar-se e proteger-se mutuamente. Nos  dão verdadeiras lições de humanismo.

Fosse no passado, esses detentos e detentas auto organizad@s poderiam ser considerad@s “boçais”( escravizad@s african@s não aculturados...).

E dentro desse sistema carcerário que caminha cada vez mais em direção à reescravização do nosso povo, essas organizações se tornam grandes quilombos modernos, Estados paralelos, e um dia seus protagonistas serão revistos como verdadeiros heróis da resistência contra a opressão que sofremos.

Ou você acha que heróis são uns caras bonzinhos? (“Só em Hollywood”...).
Ou você acha que Zumbi era um otário queridinho do governo?

Zumbi, Mariguella, Caneca e todas as pessoas que falaram em defesa do povo foram consideradas bandidas. Nós, aqui fora também precisamos aprender a nos indignar.

Mas o papo já foi longe... continuamos outro dia.
Só resta dizer, humildemente, à mãe Cintia que apesar do silêncio e paralisia covardes, nosso coração está com o dela.

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