O PRIMEIRO
COMANDO DA CAPITAL “PCC” E A PAZ NAS FAVELAS
sobre a redução
de 80% no índice de homicídios
Durante
duas décadas e meia (de 80 a 2005) as periferias de São Paulo
viveram o que podemos chamar de seus “piores anos” no que tange aos diversos tipos de violência. Porém, mesmo estando os pobres
completamente abandonados pela estrutura do Estado, de maneira geral,
só conseguíamos enxergar um tipo de violência: O homicídio. Por
isso, o homicídio, e as tentativas de, ocuparam nosso imaginário
durante todos esses anos. Não é à toa que nosso vocabulário é
fortemente influenciado por questões ligadas à morte e às armas de
fogo. Por exemplo, quando queríamos nos referir ao fim de algo,
utilizávamos expressões como: “foi pro saco” ou “subiu”. E
não as utilizávamos somente em momentos pesados, mas também em horas tranquilas, ou de admiração, como a expressão “o cara é
pá”, sendo que esse “pá” obviamente imitava o som do disparo
de uma arma.
Foi
também nessa época que os cemitérios municipais se tornaram
populares. Para termos uma ideia do índice de violência, em
Heliópolis, bairro do Ipiranga, em um só final de semana foram
assassinadas 18 pessoas e, no Jardim Ângela, chegou a morrer 60.
O
Estado, por sua vez, nunca investigava os homicídios, pelo
contrário. Fazia vista grossa. Na delegacia, a conclusão, sem
nenhum tipo de investigação, era sempre a mesma: “guerra entre
quadrilhas”. Sem exageros, afirmo que conheci mais de 200 pessoas
assassinadas e menos de 5 homicidas presos (muito diferente dos
assaltantes que sempre acabavam encarcerados). Será que é porque o Estado
só investiga realmente aquele tipo de crime que envolve
“patrimônio”?! (Alguém ainda tem dúvidas quanto a isso?)
Mas,
voltando aos assassinatos, o que permitia que seu número fosse tão
assustador era o fato de que muitas pessoas possuíam algum
tipo de arma de fogo e não havia nenhum tipo de poder soberano para
impedir que elas simplesmente resolvessem usar sua arma após
uma discussão trivial no bar. Todos sabiam que não haveria
investigação policial e que era só fugir do flagrante para depois
retomar a vida normal. Outra implicação era que os homicidas se
respeitavam entre si e raramente algum ensaiava se tornar soberano,
de forma que, desde que um não se metesse com o outro, poderiam agir
livremente oprimindo a quem não tivesse também uma arma.
Tudo isso fazia com que as pessoas oprimidas o fossem por diversos agentes.
Tudo isso fazia com que as pessoas oprimidas o fossem por diversos agentes.
A maior
parte das pessoas que comprava uma arma e tinham coragem de usá-la
para matar eram jovens abaixo de 20 anos que, na maioria das vezes,
também acabavam assassinados perto dos 20. Estávamos abandonados
num território cheio de jovens com baixa expectativa de vida, baixa autoestima e uma arma na cintura.
Nesse
período, duas armas se tornaram parte do nosso cotidiano: O revolver
calibre 38, que tomou apelido de “três oitão”, ou “canela
seca”, e a pistola calibre 380 que ficou conhecida como “PT”, ou
“quadrada”. Primeiro se tornou popular o “oitão” de, em
média, seis tiros, e depois a “PT” (semiautomática) de 16 tiros.
Da para entender a diferença né ? A “PT” não só tem mais
poder de fogo, como, pelo fato de ser semi automática, é mais difícil
de controlar, além de ser mais difícil acertar um alvo com ela. Por
isso, quando usada, causava muito mais estragos que o oitão (a
“Taurus” nos deve essa, pois fabricou, à revelia, essas armas,
que muito contribuíram com o extermínio de boa parte daquela
geração).
Atualmente,
os assassinatos dentro da periferias paulistanas se tornaram raros, quando
comparados com “os piores anos”. Boa parte dos casos de
homicídios que ocorrem hoje nas favelas contam com o envolvimento da
PM.
O motivo
dos assassinatos terem diminuído nas periferias de São Paulo está
diretamente ligado ao surgimento do Primeiro Comando da Capital o
“PCC”. E a explicação é simples, diferente das polícias
militar e civil que davam de ombros para as famílias que acabavam
de perder um ente querido, o PCC resolveu que iria se estabelecer
como poder soberano e, em determinadas situações, tomava as dores
das famílias. A partir daí constitui-se uma hierarquia e uma
burocracia. Pois, uma vez que havia um poder soberano, este
deveria ditar as novas regras (lembrando que a regra antiga era: “não
mexe comigo que não mexo contigo”). E é claro que como o
homicídio era o nosso maior problema, seria preciso discutir aquela realidade.
Então, com a
nova e necessária regra, se impôs o famoso “debate” antes de
qualquer execução. De forma que, hoje, a regra principal em relação
a homicídio é: ninguém pode cometê-lo sem antes
“debater”. No debate, forma-se um tribunal onde o caso é
discutido e o veredito é dado por um membro do PCC ou alguém muito
ligado à facção. Caso o veredito seja favorável ao “réu” a
outra parte não poderá puni-lo, a menos que o faça e depois
desapareça da região. Caso uma pessoa mate a outra, sem ter passado
pelo "debate", é muito provável que sofra retaliação. É simples
assim. Essa simples estrutura inibiu às pessoas de saírem matando
“à vontade”.
A grande
questão é que devemos comemorar a redução em 80% dos
assassinatos, mas corremos o risco do surgimento de um grupo tão
forte quanto o PCC e que lhe imponha uma guerra semelhante àquela
vista no RJ, onde o poder soberano de um grupo é frequentemente
destituído por um grupo rival. E o maior problema disso, nós
sabemos, é que quando este novo grupo se estabelece no novo
território costuma tomar de assalto até a casa dos antigos
moradores para estabelecer sua nova casa. Ou seja, ressuscitam o
terror.
sim... e há possibilidade outra qe não facção e poder por violência ? ou poder é violento ? O PCC já está nas entranhas do Estado ? questões que me passam ... saudades de você Dinha ... beijo e seguimos na luta
ResponderExcluirNa luta!
ExcluirO mais importante pra nóis favelados pé de barro é que os índices de morte diminuíram muito em SP capital. Só quem perdeu amigos e parentes sabe o que isso significa. Será que o poder, dentro do capitalismo, é violento? Será? Não importa quem reduz nosso sofrimento o que importa é a redução. O PCC se relaciona muito bem com a quebrada, nada a ver como o que acontece com as facções do RJ e Norte e NE, é só perguntar nas quebradas. Bom dia, Du.
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