Poema
pouco poema
para o pobre rapaz que foi roubado três
vezes e assim justifica o seu racismo
"Sem
máscara ele até que não era tão estranho. Parecia gente. Parecia
com tanta gente. Com toda a população do Brasil, esse país que
também usa uma máscara de plástico para disfarçar a cara de pau
que lhe permite vez em quando esquecer que está aqui a maior
população negra fora da África."
Cristiane
Sobral
Somos
negras.
No
feminino e no masculino.
Estamos
em muitos lugares.
Na
motorista do ônibus que nos leva e nos traz pelas veias da cidade.
Na
atendente de telemarketing.
Na
caixa de supermercado.
Na
empregada doméstica.
Na
escritora esquecida.
Na
metalurgia.
Na
dona de casa.
No
rapaz que entrega as cartas.
Ainda
que não se saiba.
No
feminino e no masculino.
Estamos
em muitos lugares
Pouco
valorizados.
Mas
isso não dói em nada.
O
chato é ter que ouvir os trouxas ruminando espasmos:
Três
pretos lhe roubaram.
Logo,
pretos
são safados.
O
chato é ter que repetir feito gralha
o
que o rapaz não viu (olhos fixos no código de barras):
a
motorista que lhe levou pra casa
a
que lhe atendeu a chamada
a
que lhe deu o troco
a
que lavou seu chão, seu choro
os
versos
o
cuidado materno.
Três
pretos lhe roubaram
e
ele só viu
o
que vêem os otários
o
que a telinha explica
o
racismo injetado no cérebro como um cavalo
pisoteando
a inteligência do pobre
rapaz
cego e roubado.
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